quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Carta aberta de uma professora à nova Secretária de Educação

Carta aberta à Secretária de Educação da nova administração do município de Novo Hamburgo Maristela Guasselli
Senhora futura secretária de educação de Novo Hamburgo, Maristela Guasselli, venho pronunciar-me em nome de muitos professores e professoras das escolas públicas deste município. Estou atuando na educação de Novo Hamburgo há quatro anos e meio e desse tempo em diante tenho observado perdas históricas por parte dos profissionais da educação. Apesar disso, estou muito esperançosa com seu nome para ocupar esse cargo. Seu nome foi muito bem elogiado em alguns dos círculos que eu frequento.
O novo sempre nos causa expectativas, esperanças, projeções e sonhos e gostaria de compartilhar com a senhora alguns desses sonhos dos docentes de Novo Hamburgo. Como afirmei antes, vi nossos professores e professoras perderem muitos direitos ao longo desses anos. Cheguei no município com o plano de carreira destroçado, estraçalhado e pisoteado. Não encontro outra forma para descrever como se sentem os professores que ingressaram com o último plano de carreira. O que mais me chama atenção é que nossa formação não é reconhecida, ou seja, um professor ou uma professora que faz pós-graduação, mestrado e doutorado não recebe de imediato por essa brilhante trajetória acadêmica. Deve aguardar o prazo de cinco, dez e até quinze anos para poder receber pela sua formação. Docentes que concluem o doutorado só irão receber por isso em quinze anos! Qual a consequência disso? Profissionais desmotivados e sem incentivos para continuarem seus estudos ou indo trabalhar em outras redes que valorizem seus diplomas. É inconcebível que uma rede de educação não reconheça a importância da formação continuada de seus professores. Qual o professor ou professora de Novo Hamburgo que terá motivação para aperfeiçoar-se? E os que continuam seus estudos na pós graduação, esperarão quinze anos para receber por isso ou irão para as redes vizinhas onde serão valorizados? Assim, a longo prazo, Novo Hamburgo sai perdendo em todos os lados, pois ficará apenas com os professores com menores formações, enquanto os professores mestres e doutores estarão nos municípios vizinhos. As outras redes irão captar para si os profissionais com maior titularidade, enquanto Novo Hamburgo perde estas pessoas em seu quadro.
Para piorar a situação, a prefeitura ainda não cumpre o artigo 50 do plano 2340/2011, a saber: “Os professores que ingressaram com base na lei 200/2009, com formação de nível médio, na modalidade magistério ou normal, terão os respectivos vencimentos padrões automaticamente reclassificados para a faixa de vencimentos correspondente ao nível de formação superior, tão logo comprovada formação nos termos do disposto na alínea “a” dos incisos II e III do artigo 19 retro, e desde que cumprido o estágio probatório”. O município de Novo Hamburgo ainda não está remunerando as professoras que foram reclassificadas para o nível superior. Para onde essas professoras vão? Novo Hamburgo perde profissionais qualificadas pelo não cumprimento da lei.
Outra pauta importante é a questão da hora atividade. De acordo com a Lei do Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN) 11.738/08, os docentes têm direito a um terço de hora atividade. O município de Novo Hamburgo ainda é um dos poucos que não cumpre essa lei. Acredito que a senhora, como professora, entenda a importância desses momentos de planejamento de aulas, correção de trabalhos e provas, atendimento de pais e alunos, etc. Novamente Novo Hamburgo está atrás, não cumprindo a lei. Essa é uma pauta que foi exaustivamente discutida e negociada com a antiga prefeitura, sem sucesso algum. Novamente trazemos esta questão para você considerar isto como um investimento na melhora da educação do município, pois terá professoras mais preparadas para entrar em sala de aula, com mais tempo para pensar em atividades e materiais didáticos aos alunos.
Ainda neste tema, muito se conversou com a antiga prefeitura sobre a necessidade de Novo Hamburgo implementar o planejamento domiciliar. E é uma necessidade mesmo. A escola não é o melhor ambiente para planejar aulas. Sem contar que muitas vezes o professor de planejamento vira professor substituto, tendo que entrar em sala de aula e não conseguindo realizar suas atividades. Cito alguns problemas do planejamento na escola: solicitações constantes de alunos, substituição de professores faltantes, barulho, falta de computadores, falta de internet (muito frequente), entre outros. É realmente uma necessidade para os professores e professoras terem um ambiente tranquilo onde possam planejar suas aulas. Novamente, com a atual realidade, quem perde é o município e os alunos, pois os docentes têm menos tempo para se dedicarem a tarefas extra classes.
Este ano ainda tivemos outra perda: o almoço na escola. Nem preciso dissertar sobre os benefícios de alunos e professores comerem juntos, a mesma comida. Mas posso falar sobre o trabalho extra que estamos enfrentando: o valor do vale alimentação não cobre sequer 10 dias de almoço em restaurantes; mais tempo em casa cozinhando para levar o almoço do dia seguinte, tempo este que poderia estar sendo usado para criar e planejar atividades bacanas aos alunos; a perda do momento de lazer com os alunos; os professores passam por esnobes que não comem a mesma comida dos alunos; o sentimento de abandono, rejeição e descaso pelos profissionais da educação que estão impedidos de almoçar a comida produzida em seu próprio ambiente de trabalho. Acredito que isto é algo que pode ser revisto com a nova administração. Com certeza não é o almoço dos docentes que deixa o município mais pobre.
Estas são algumas questões que gostaria de salientar nesta carta, tenho certeza que existem outras tantas. São questões que estão incomodando muito os professores e professoras do município. Percebo que a antiga administração era bastante inflexível nas pautas citadas, sempre afirmando a impossibilidade de realizá-las. Porém o novo secretário de cultura afirmou em seu discurso que irá fazer o impossível em Novo Hamburgo. Esperamos que o impossível se torne realidade também na secretaria de educação.
Finalizo deixando novamente minhas esperanças de um futuro mais promissor para a educação de Novo Hamburgo que, todos percebem, decaiu profundamente nos últimos anos. Novo Hamburgo tem se tornado um lugar de passagem, onde professores e professoras apenas aguardam para serem chamados em um lugar melhor. Essa rotatividade é extremamente prejudicial às escolas, à prefeitura e principalmente aos alunos, que não conseguem criar vínculos com os professores. O município vem perdendo profissionais qualificados que abandonam a rede pela falta de incentivos e de valorização, indo trabalhar nas redes vizinhas que oferecem mais atrativos. Vi ótimos colegas indo embora porque “foram chamados em um lugar melhor para trabalhar”. Eu (ainda) não quero ir embora. Eu prefiro ficar e lutar para melhorar o que já existe. Tenho certeza que os professores e professoras de Novo Hamburgo estão apostando em você. Novo Hamburgo já foi primeiro lugar em educação. Que voltem estes tempos.
Ass: Cristine Zirbes Severo, professora da Rede Municipal de Ensino de Novo Hamburgo.

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