quinta-feira, 27 de março de 2014

A pedagogia da luta

A luta direta contra a burguesia e o Estado burguês é relativamente fácil. Qualquer um, por mais despolitizado que seja, reconhece que “patrão é patrão” e que vivemos numa sociedade absolutamente injusta. O problema é a hegemonia das ideias da burguesia no seio da própria classe trabalhadora, ou seja, a continuação do pensamento “patrão é patrão” é o de que “as coisas são assim mesmo”. E mesmo nos momentos de radicalização (como agora), estas ideias imperam e estão, inclusive, dentro dos grupos ditos “revolucionários” e dos comitês de organização das lutas.
Quantas vezes nos apanhamos pensando de forma determinista e fazendo malabarismos cerebrais para justificar posições e ações recuadas, de concessão à força da burguesia? Quantas vezes acusamos os outros de serem conservadores para não darmos uma chance à possibilidade de mudança?
Aqui é necessário um parêntese: o contrário disso é o pensamento auto-referente, ou seja, dono da chave da história e portador de todas as verdades. A “direção” distorcida do leninismo-trotskismo-estalinismo histórico, que do mesmo modo despreza a capacidade de reflexão dos outros. O que não deixa de ser a reprodução do conhecimento burguês, a saber, o positivismo. As direções históricas da chamada esquerda tendem mais a Maquiavel do que a Marx.
Nós não escolhemos o campo nem as regras do jogo: estão pré-colocadas pelas classes dominantes desde a acumulação primitiva. Por isso, na luta política, ocupar espaços de poder e de organização da sociedade é um desafio cotidiano, mas absolutamente necessário, na medida em que não nos referenciamos no anarquismo.
Em nossas organizações somos desafiados a refletir segundo a segundo sobre nossas práticas, sob pena de reproduzirmos a lógica dominante da hierarquia e do interesse econômico. Na medida em que toda a organização social é determinada e instituída na lógica das classes dominantes, dentro da lei do Estado burguês, somos forçados a trafegar por ela, sob pena de exclusão do processo civilizatório.
Mediarmos este tráfego com os objetivos históricos da classe trabalhadora; como não sucumbir aos privilégios e como a classe trabalhadora se organizará de forma independente a partir do que está dado é o nosso desafio.
A reflexão de nossa prática passa pela desconstrução do senso comum. A primeira imposição mecânica para a afirmação da lógica positivista é a corrida contra o tempo proporcionada pela competição. O tempo necessário para uma reflexão adequada nos é roubado pelo próprio processo de exploração do trabalho, que nos obriga a vender nossa força de trabalho em troca das condições de sobrevivência. É contra esta primeira dificuldade que devemos lutar.
Mas não há porque desesperar. Uma prática calcada na reflexão produz efeitos reais mesmo em curto prazo, muito mais do que a absorção acrítica e a reprodução simplista dos mitos da ideologia dominante. Apesar de que pensar dói. E o pensar coletivo requer ainda mais esforço.
O segundo elemento é a teoria do conhecimento que constrói a estrutura do discurso com o qual analisamos e procuramos entender a realidade que nos cerca. O positivismo, a teoria do conhecimento que baliza o discurso das classes dominantes e justifica o capitalismo, tem por principal característica a naturalização da história e, a partir daí, como uma sequencia mecânica de fatos, ou, ainda, os fatos como condição da história. Para a leitura materialista histórica, é a história que produz os fatos. Tudo o que acontece é determinado por seu próprio passado.
O positivismo desconecta os fatos, fragmenta as ideias, o que pode ser exemplificado pela estrutura estético-literária dos textos na mídia tradicional e mesmo na didática da sala de aula, onde se impõe uma “simplificação” que nada mais é do que uma omissão. Ao retirarmos informações, estamos estreitando o campo de conhecimento e, portanto, limitando a capacidade de análise daqueles que carecem destas informações.
A estrutura em tópicos é um bom exemplo do método de discurso positivista tido no senso comum como uma ferramenta decisiva de aprendizado. Ao contrário, os tópicos, ao invés de levarem o cérebro a desenvolver uma lógica dialética, produzem uma apreensão que estreita a realidade em pontos isolados, o fato pelo fato. E ao invés de ensinar, ensinam a desaprender.
A burguesia nos castiga cotidianamente com seus conceitos estruturantes: livre mercado, livre iniciativa, propriedade privada, lucro, e constrói estes conceitos a partir de uma inversão da realidade, tornando-os absolutos e demonizando o contradito, qual seja, os conceitos do materialismo-histórico-dialético, que percebem a história da humanidade como a história da luta de classes, cujo motor são as contradições geradas pela luta entre os interesses econômicos irreconciliáveis de explorados e exploradores: a luta de classes como conceito estruturante da análise da micro economia, e do grande capital internacional como conceito estruturante para a compreensão da macro economia.
Cada trabalhador que se apresenta para a luta traz consigo sua própria história, suas qualidades e limitações, suas contradições e idiossincrasias, mas na sua dialética psicológica, na sua luta interna entre o medo e o desejo, entre Tanatos e Eros, Eros venceu e o trouxe até aqui, para este fazer coletivo que se dá potencializado na psicologia das massas, nos medos e desejos coletivos e que assim se manifestam, transbordando a vida privada.

3 comentários:

Anônimo disse...

Conteúdo consistente, coerente com a realidade histórica,consciente das dificuldades existentes ,mas sobretudo, numa firmeza de pensamento de luta continua.

EMEFCONDED'EU disse...

De quem é a autoria?

SindProf / NH disse...

Olá colegas da Conde D´Eu

Este texto foi produzido pela assessoria de comunicação social do Sindprofnh.
Obrigado pela leitura.